Droga mais forte que fentanil gera preocupação

Droga mais forte que fentanil gera preocupação

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Zulfikar Abbany
Desenvolvido nos anos 1950, nitazeno tem causado mortes nas ruas dos EUA e Reino Unido. Substância é misturada a outras drogas para baratear custos de produção.

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Dependentes químicos deitados em uma calçada na Filadélfia  Nitazeno emergiu dos arquivos farmacêuticos para se tornar uma droga mortal nas ruasFoto: Spencer Platt/Getty 

Justamente quando as comunidades começavam finalmente a compreender os efeitos do abuso de drogas como fentanil e oxicodona, outro analgésico emerge dos arquivos farmacêuticos para se tornar uma droga mortal nas ruas. Conhecido pelo nome de nitazeno, os opioides 2-benzilbenzimidazol podem ser 500 vezes mais fortes do que a heroína, o que deixa os usuários mais propensos à dependência.

Agências de controle de medicamentos nos Estados Unidos, Reino Unido e em outros países da Europa relatam um aumento no número de overdoses e mortes associadas ao uso de nitazeno, que é mais forte do que o fentanil.

Indícios sugerem que, enquanto as autoridades trabalham para reprimir o uso do fentanil e a produção da heroína no Afeganistão sob o regime do Talibã, o nitazeno vem sendo misturado a outras substâncias, como heroína, fentanil e até na maconha.

O que é o nitazeno?

Desenvolvido nos anos 1950 como um opioide analgésico, o nitazeno é uma classe de mais de 20 compostos químicos sintéticos. O medicamento, porém, jamais foi aprovado para uso médico ou veterinário.

Drogas sintéticas como o nitazeno e o fentanil não são produzidas naturalmente ou cultivadas no meio ambiente, como a heroína ou a maconha, mas sim, fabricadas artificialmente tendo como base produtos químicos.

Os primeiros registros do uso ilícito do nitazeno são de 2019 nos EUA, Reino Unido e nos Bálcãs, embora à droga seja associada a mortes ocorridas na Rússia em 1998.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) o define como uma substância psicoativa, o que significa que “afeta processos mentais, incluindo a percepção, consciência, cognição, humor e emoções”. Nem todas as substâncias psicoativas são viciantes, mas o nitazeno seria muito mais potente do que seus análogos naturais, como a morfina ou a heroína. Dessa forma, segundo especialistas, tem maior probabilidade de causar dependência.

O nitazeno é uma substância controlada, ou seja, geralmente classificada como um narcótico perigoso e ilegal.

Quando comercializado em pó, o nitazeno possui uma coloração amarela, marrom ou esbranquiçada. A Administração de Fiscalização de Drogas (DEA) dos EUA também afirma que a substância pode ser vendida em forma de pílula e “comercializada de maneira falsa como medicamento farmacêutico, classificada como comprimidos de dilaudid M-8 ou de oxicodona M30”.

Os efeitos são similares aos de outros opioides, como euforia, sedação e um tipo de consciência dormente-acordada, mas também pode causar paradas respiratórias.

 

Por que o risco de overdose é tão alto?

Em carta aberta publicada no jornal de saúde Lancet Public Health em fevereiro de 2024, o Centro Europeu de Monitoramento de Drogas e Dependência Química (EMCDDA) escreveu que, desde 2022, houve um aumento na identificação do nitazeno em autópsias de óbitos associados ao uso de drogas.

Há evidências de que o nitazeno esteja sendo misturado com outras drogas ilícitas como forma de reduzir os custos de produção. Segundo Adam Holland, da Escola de Ciências Psicológicas de Bristol, no Reino Unido, o nitazeno foi detectado em substâncias como opioides, benzodiazepínicos e produtos de cannabis.

“Isso significa que muitos consumidores utilizam nitazeno inadvertidamente, sem estar ciente dos riscos que correm”, escreveu Holland no Lancet Public Health. Parte desses riscos é o fato de os usuários não conseguirem dosar a quantidade da droga que consomem, já que eles simplesmente não sabem o que estão usando.

Essa análise advém, por exemplo, de estatísticas do Reino Unido, onde em um período de seis meses até dezembro de 2023, mais de 50 pessoas morreram após consumirem nitazeno.

O quão viciante é o nitazeno?

É difícil afirmar concretamente o grau de dependência das substâncias ilícitas, incluindo o nitazeno – uma vez que são raros os casos em se pode determinar esse teor de maneira isolada. Há uma variedade de fatores biológicos, psicológicos e sociais que influenciam as desordens causadas pelo uso da substância, incluindo a dependência, e como um indivíduo é afetado por ela.

Os farmacologistas, ao contrário, utilizam como referência o grau de potência da droga.

Um relatório de 2022 da Comissão de Aconselhamento sobre o Abuso de Drogas (ACMD) do Reino Unido menciona uma análise de estudos, nos quais os cientistas administraram 2-benzilbenzimidazol, incluindo isotonitazeno – conhecido nos EUA como “ISO” – e etonitazeno, em ratos. Foi concluído que o isotonitazeno seria 500 vezes mais potente do que a morfina, enquanto o etonitazeno seria mil vezes mais forte.

Quais os efeitos no organismo?

O nitazeno interage com vários receptores de opioides no cérebro e no sistema nervoso. Em um alerta do governo britânico, um desses receptores foi descrito como sendo um “mediador principal” no cérebro que influencia funções positivas e terapêuticas, como o alívio à dor e o sistema de recompensa, causando uma sensação de euforia.

Outra análise de 2022 sobre o funcionamento de um dos receptores do cérebro concluiu que “tanto os efeitos terapêuticos quanto os indesejados dos opioides são exercidos por meio de sua conexão” com esses receptores. Esses efeitos indesejados incluem dependência, vício, tolerância e sintomas de abstinência.

Alerta, destemido e sem fome

A droga foi produzida por um japonês, inicialmente em forma líquida. Químicos da fábrica berlinense Temmler aperfeiçoaram o produto e o patentearam em 1937. Um ano mais tarde o medicamento era lançado no mercado. Ele era usado contra cansaço, sensação de fome e sede e medo. Hoje em dia, o Pervitin é comercializado ilegalmente sob novo nome: Crystal Meth.

 

“Milagrosa” heroína

A criatividade dos produtores de drogas na Alemanha já havia começado muito mais cedo. “Fim à tosse graças à heroína”, era o slogan da fabricante alemã Bayer no final do século 19 para o seu sucesso de vendas. Em pouco tempo, a heroína passou a ser prescrita contra epilepsia, asma, esquizofrenia e doenças cardíacas, mesmo em crianças. Como efeito colateral, a Bayer apontava prisão de ventre.

 

Pai da aspirina e da heroína

O químico e farmacêutico Felix Hoffmann é celebrado especialmente como o inventor da aspirina. Sua segunda grande descoberta aconteceu quase por acaso, enquanto experimentava com ácido acético. Ele resolveu combinar este ácido com morfina, obtido do suco da papoula usada para produzir ópio, criando assim a heroína. O produto só se tornaria ilegal na Alemanha em 1971.Felix Hoffmann, químico e farmacêutico

Cocaína para oftalmologistas

Já desde 1862, a alemã Merck fabricava cocaína, usada na época pelos oftalmologistas como anestésico local. Ao pesquisar folhas de coca da América do Sul, o químico Albert Niemann havia isolado um alcaloide, que chamou de cocaína. Niemann morreu pouco depois de sua descoberta, vítima de um problema pulmonar.

 

Freud e cocaína

Sigmund Freud consumia cocaína para fins científicos. Em seus “Escritos sobre a cocaína”, o pai da psicanálise escreveu que ela não traz inconvenientes. Segundo ele, a substância transmite euforia, energia para viver, e motiva a trabalhar. Seu entusiasmo, no entanto, acabou com a morte de um amigo por causa da droga. Naquele tempo, a cocaína era prescrita contra dor de cabeça e dor no estômago.

 

O barato do Ecstasy

Embora o americano Alexander Shulgin seja considerado o inventor da pílula Ecstasy, a receita para sua produção estava em mãos da fabricante alemã Merck. Em 1912, foi dada entrada para a patente de uma substância oleosa sem cor chamada metilenodioximetanfetamina (MDMA ). Na época, os químicos consideraram que ela não teria valor comercial.

 

Efeitos de longo prazo

Os efeitos destas descobertas são implacáveis. As Nações Unidas calculam que em 2013 morreram 190 mil pessoas no mundo devido ao consumo de drogas ilegais. Em relação a bebidas alcoólicas, que não são proibidas, os números são mais impressionantes: a Organização Mundial da Saúde estima que em 2012 5,9% de todos os casos de morte no mundo (3,3 milhões) foram uma consequência do consumo de álcool.

Fonte : DW

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