A questão mais importante que os alemães enfrentam no início de 2022 é a mesma do ano anterior: a pandemia de covid-19. No entanto, há uma diferença fundamental: naquela época, a recém iniciada campanha de vacinação ainda dava esperança de que o fim da pandemia estava próximo.
Mas, um ano e bem mais de 100 milhões de doses de vacinas depois, o número de novas infecções na Alemanha é substancialmente maior do que no início de 2021.
Para que mais pessoas sejam vacinadas, a obrigatoriedade da vacinação pode ser implementada em breve.
Isso, porém, significaria uma quebra de promessa de importantes políticos, já que a ex-chanceler federal Angela Merkel, da CDU, seu sucessor Olaf Scholz, da SPD, e o líder do FDP, Christian Lindner, agora ministro das Finanças, haviam descartado anteriormente tal obrigatoriedade.
As medidas tomadas para controlar a pandemia na Alemanha dividem a sociedade – embora uma maioria de pessoas apoiem a vacinação, há uma minoria barulhenta que se opõe a ela.
Planos climáticos ambiciosos
O novo governo de social-democratas de centro-esquerda (SPD), verdes e democratas livres neoliberais (FDP) quer manter o ímpeto positivo quando se trata de ação contra as mudanças climáticas. “Ouse mais progresso” foi o título do acordo de coalizão, em alusão ao lema de 1969 do ex-chanceler Willy Brandt (SPD), “Ouse mais democracia”.
A coalização no poder promete tomar medidas para proteger o clima por meio de fontes de energia renováveis e, de preferência, eliminar a energia gerada pelo carvão antes do planejado – possivelmente em 2030.
O que os eleitores alemães pensam sobre os planos do novo governo determinará os resultados de quatro eleições estaduais: Sarre, Schleswig-Holstein, Renânia do Norte-Vestfália e Baixa Saxônia. De acordo com pesquisas recentes, espera-se que o ressurgimento dos social-democratas continue, depois de anos de declínio.
O CDU se moverá para a direita?
No início do novo ano, os democratas-cristãos de centro-direita (CDU) estão se acomodando em seu novo papel como partido de oposição após 16 anos no poder e esperam um novo ímpeto quando o novo presidente do partido for oficialmente confirmado, agoa em janeiro.
Friedrich Merz, de 66 anos, recebeu o apoio da maioria dos 400.000 membros do partido em dezembro, após duas tentativas fracassadas de assumir o cargo. Merz, ex-líder do grupo parlamentar e inimigo de Angela Merkel, é um ferrenho conservador e deve conduzir a CDU mais para a direita.

Em fevereiro, a escolha do presidente da Alemanha não deve ter surpresas. O atual presidente alemão Frank-Walter Steinmeier, do SPD, quer permanecer no cargo. Suas chances parecem boas – até agora ninguém manifestou interesse em assumir a vaga.
Além disso, os atuais partidos da coalização governamental têm maioria na Assembleia Federal, composta por membros do Bundestag e representantes dos 16 estados responsáveis por eleger o próximo presidente.
Política externa
Em termos de política externa, 2022 pode ser a hora de a Alemanha se destacar, sobretudo durante sua presidência do G7. As ameaças russas contra a Ucrânia e a China cada vez mais triunfante na política global são apenas dois grandes desafios nessa área.
A nova ministra das Relações Exteriores, Annalena Baerbock, do Partido Verde, sinalizou que adotará uma abordagem diferente da do governo da ex-chanceler Angela Merkel no que diz respeito à China. Ela deseja seguir uma política externa baseada em valores e ser mais ativa nas questões de direitos humanos em estados totalitários.

Mas o cientista político Johannes Varwick, da Universidade Martin Luther Halle-Wittenberg (MLU), prevê que Baerbock “logo sentirá as restrições do cargo e a pressão da realpolitik” (política ou diplomacia
“Vejo isso especialmente na questão de saber se os direitos humanos podem realmente ser considerados a referência final para a ação da política externa”, explica.
O chanceler Olaf Scholz parece querer continuar a abordagem reservada de política externa de sua antecessora. “É preciso haver cooperação no mundo, também com governos que são muito diferentes dos nossos”, disse ele à emissora pública alemã de televisão ZDF, após assumir o cargo.
Nesse contexto, será interessante ver se o novo governo ficará ao lado do presidente dos EUA, Joe Biden, e será levado a um confronto mais forte com a China.
Henning Hoff, do Conselho Alemão de Relações Exteriores (DGAP), diz que a Alemanha precisa “parar de se preocupar com o fato de a indústria alemã não ter futuro sem o mercado chinês, e adotar uma postura muito mais forte e estratégica e lidar com a China como um rival sistêmico”.
Hoff acredita que, quando se trata da Rússia, é preciso usar “o gasoduto Nord Stream 2 para pressionar Moscou” e “interromper o projeto se houver alguma agressão à Ucrânia”.
Planos para a Europa
No que diz respeito à Europa, o acordo de coalizão estabelece o objetivo de longo prazo de a União Europeia (UE) se transformar em um “estado europeu federal”. Há muito tempo que essas ideias ambiciosas não eram ouvidas.
Ao mesmo tempo, o novo governo de Berlim apela a uma política de asilo a refugiados relativamente liberal também a nível europeu, o que pode revelar-se difícil de se concretizar.
Mais unidade da UE e refugiados são questões polêmicas – isso ficou claro no final do ano passado em dois países do bloco que têm particular importância para a Alemanha: Polônia e França.
Jaroslaw Kaczynski, chefe do partido governista Lei e Justiça (PiS), disse que as políticas do novo governo alemão colocam em risco a soberania dos países europeus.

A França tradicionalmente tem uma parceria estreita com a Alemanha, mas os dois países não concordam em algumas questões cruciais.
Em abril, a França realizará eleições presidenciais – e o principal tópico da campanha deve ser a imigração indesejada.
O presidente Emmanuel Macron quer usar a virada iminente de seis meses da França na presidência rotativa do Conselho da União Europeia para proteger as fronteiras externas do bloco, algo que não é uma prioridade para a coalizão de Berlim.
O analista político Hoff considera as “ambições de política europeia” do novo governo alemão não apenas corretas, mas necessárias. “Se a UE quer se tornar mais soberana e confiante – e deve se quiser perdurar – não será capaz de evitar maior reestruturação”.
Mas Varwick rejeita a meta de um estado federal europeu como irrealista: “Isso vai se desmantelar rapidamente diante das realidades políticas europeias. Ninguém na Europa realmente quer isso”.
Em vez disso, ele elogiou o conceito de “liderança servil” para a Europa que também pode ser encontrado no acordo de coalizão: “Porque se trata de usar o poder e a influência da Alemanha de uma forma que não desencadeie reflexos defensivos, mas, em vez disso, abre espaço para manobra . ”
Seguindo os passos de Merkel
A ex-chanceler Angela Merkel teve um papel especialmente importante no cenário diplomático global e de liderança absoluta na política europeia. Olaf Scholz vai querer seguir os passos dela – e será capaz?
Henning Hoff aponta que Scholz mostrou as qualidades de liderança importantes de “prudência e um pragmatismo voltado para soluções”.
Johannes Varwick acredita que Scholz “não pode competir com a experiência de Angela Merkel”. No entanto, acrescenta que a Alemanha tem grande peso político, independentemente de quem seja o chanceler.
Scholz, “com sua natureza despretensiosa e conciliadora, parece um sucessor adequado para a ‘chanceler eterna'”, disse Varwick.
As “palavras do ano” na Alemanha ao longo da última década
Desde 1977, a Sociedade para Língua Alemã seleciona a Palavra do Ano, um termo ou expressão que reflete um tema da atualidade e se distingue pelo seu significado e sua qualidade linguística. Veja as dos últimos anos.
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2021: “Quebra-mar”
“Wellenbrecher” (quebra-mar ou, literalmente, quebra-ondas) é a Palavra do Ano de 2021. O termo, que geralmente define um paredão que oferece proteção contra o impacto das ondas do mar, ganhou novo significado na pandemia de covid-19. A palavra passou a ser usada para se referir a medidas adotadas para proteger a população e interromper ondas da doença.
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2020: “Pandemia de coronavírus”
Nenhuma outra palavra definiria melhor o ano de 2020. O coronavírus, que surgiu pela primeira vez na cidade chinesa de Wuhan no final de 2019, se espalhou rapidamente pelo mundo. A epidemia se transformou em pandemia global que resultou em milhões de mortos em todo mundo.
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2019: “Aposentadoria de respeito”
O novo termo, criado a partir das palavras “Respekt”, respeito, e “Rente”, aposentadoria, referiu-se à introdução de uma aposentadoria de base para quem contribuiu para a previdência social por pelo menos 35 anos, mas cuja pensão ainda é inferior ao nível de subsistência. Segundo o júri, a palavra não se destaca só por questões linguísticas, mas também no debate político.
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2018: “Era quente”
O verão europeu de 2018 foi marcado pelo calor e pela seca. Como a Palavra do Ano 2018, “Heisszeit” (era quente) também indica a dimensão da mudança climática. Portanto, não surpreende que o termo “era quente” seja uma analogia para “era do gelo”. O verão de 2003 já havia sido extremo, e o de 2019 também foi mais quente do que a média.
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2017: “Fim da Jamaica”
A negociação entre três partidos alemães para formar uma coalizão de governo durou semanas, mas fracassaram. O nome “coalizão Jamaica” se deve às cores dos partidos: CDU (preto), liberais (amarelo) e Verdes, as mesmas da bandeira da Jamaica. Mas a palavra não tem apenas o sentido político, explicou o júri, também é linguisticamente interessante porque a pronúncia de Jamaica foi germanizada.
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2016: “Pós-verdade”
“Postfaktisch”, equivalente a pós-verdade, é empregado para descrever uma cultura política baseada sobretudo em paixões e impressões pessoais, em detrimento dos fatos, e com fins de manipulação. Durante a campanha eleitoral de Donald Trump à presidência dos EUA, em 2016, a palavra “pós-verdade” foi usada repetidamente em conexão com a disseminação de fake news.
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2015: “Refugiados”
A crise migratória sem dúvida marcou o ano de 2015, por isso linguistas da Sociedade para Língua Alemã (GfDS) escolheram “refugiados” (“flüchtlinge”) como a Palavra do Ano de 2015.
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2014: “Fronteira de luzes”
O termo vencedor em 2014 foi surpreendente: o júri escolheu “Lichtgrenze” (“fronteira de luzes”), em referência a uma instalação feita em Berlim em comemoração aos 25 anos da queda do Muro de Berlim.
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2013: “GroKo”
O termo “GroKo” vem de GROsse KOalition e significa “grande coalizão”, referindo-se ao governo formado pelos partidos CDU/CSU e SPD, os maiores da Alemanha. Em sua alusão a “Kroko”, a abreviação de “crocodilo”, também mostra uma atitude zombeteira, de acordo com o júri. Na foto, a chanceler federal Angela Merkel (CDU), e seu vice na época, Sigmar Gabriel (SPD).
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2012: “Rotina de salvamento”
A palavra “Rettungsroutine” (rotina de salvamento) marcou o ano devido aos vários pacotes de ajuda para salvar países da União Europeia da falência. A palavra reflete a situação econômica instável da Europa e descreve as inúmeras medidas recorrentes para estabilizá-la, disse o júri.
2011: “Teste de estresse”
A palavra “Stresstest” (teste de estresse) expressou da melhor forma o espírito do ano e até mesmo passou a ser usada na linguagem cotidiana, argumentou o júri. O “teste de estresse” foi aplicado em bancos, estações ferroviárias, governos e usinas de energia nuclear para verificar sua resistência e desempenho em situações fictícias extremas.
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2010: “Cidadãos furiosos”
“Wutbürger” (cidadãos furiosos), foi a Palavra do Ano na Alemanha em 2010. Segundo o júri, o termo expressa a indignação de que decisões políticas sejam tomadas desconsiderando os interesses da população: “A palavra documenta uma grande necessidade entre os cidadãos de poder se manifestar sobre projetos social e politicamente relevantes”.
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