Por que o dólar se mantém forte

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Em 1945, a moeda americana passou a ser usada como meio para realizar negócios internacionais. Falta de confiança no governo Trump pode até reduzir dominância, mas verdade é que ainda não se confia nas alternativas.

    

Nota de um dólar sobre bandeira dos EUA em concreto, desmoronando 

Se a estabilidade de moedas tiver como base a confiança em seus emissores, o momento atual não é bom para o dólar. De Washington, Donald Trump briga com meio-mundo. Em meio à guerra comercial com a China, o presidente americano criou caso com a Rússia e com a Turquia. Mas ambos revidaram mirando em seu ponto fraco: questionaram a posição dos Estados Unidos como potência mundial.

A trajetória vitoriosa do dólar rumo ao estabelecimento como moeda estável teve início no dia 14 de fevereiro de 1945, a bordo do navio de guerra USS Quincy, que naquela data estava ancorando nos Lagos Amargos egípcios, perto do Canal de Suez.

Nos porões do cruzador armado com canhões antiaéreos, foi instalada um salão de recepção improvisado, com algumas cadeiras e mesas arranjadas de forma apressada sobre um tapete oriental e a bandeira americana.

Ao fundo, as paredes de aço do poderoso navio. Apenas algumas pessoas estavam presentes. O presidente Franklin D. Roosevelt prometeu proteção militar ao seu convidado saudita. Por sua vez, o rei Ibn Saud se comprometeu a realizar todos os negócios de petróleo em dólar a partir daquele momento.

Dez anos depois da abolição do padrão-ouro, a moeda dos EUA voltava a ser acoplada a uma matéria-prima: o chamado “ouro negro”.

Um caso de sorte para Washington, já que a demanda por petróleo subiu rapidamente nos anos seguintes – e, com ela, a demanda pelo dólar, com o qual cada vez mais negócios internacionais passaram a ser fechados.

Continua assim até hoje. O Fundo Monetário Internacional (FMI) estima que 62% das reservas de moeda forte do mundo sejam em dólares. Para comparar, o euro é reserva cambial em 20% dos casos, seguido pelo iene e pela libra esterlina, responsáveis por nem 5% das reservas.

Transferências de divisas também são realizadas quase que exclusivamente em dólar: 85% das trocas internacionais de moedas são feitas usando a moeda americana.

O Fed, banco central dos EUA, sempre apoiou a função de moeda forte do dólar e garantiu liquidez suficiente. Afinal acaba sendo por isso que a dominância da moeda americana é uma circunstância que se mantém por si mesma.

É que a liquidez do dólar o torna interessante como “porto seguro” para investidores – afinal, ele pode ser negociado rapidamente. Às vezes, isso cria situações grotescas: por exemplo, quando a coisa começa a ficar feia em outras classes de ativos, os investidores – naturalmente incluindo bancos centrais e empresas – recorrem ao dólar. E isso mesmo quando há grandes ameaças para a economia mundial vindas precisamente dos EUA.

O último caso em que isso aconteceu foi na crise financeira global a partir de 2007. Outro exemplo é a contenda constante no Congresso americano sobre o teto máximo da dívida pública do país.

O economista Barry Eichengreen fala num “privilégio descarado” para os EUA. Ao mesmo tempo, também ele não vê alternativa, já que os dois principais rivais monetários do dólar têm seus próprios problemas: o euro, segundo Eichengreen, é uma moeda sem país, e o renmimbi chinês é uma moeda com “país demais”.

Isso quer dizer que, quando o euro desvaloriza, não existe um governo que pode se responsabilizar pela estabilidade da moeda única europeia. Já a moeda chinesa é controlada mais pela liderança política do que por forças da economia de mercado.

Atualmente, é difícil falar de uma situação controlada nos EUA de uma perspectiva política e econômica. Trump não hesita em acusar outros países – incluindo a China, concorrente monetária – de manipular o renmimbi. No tuíte seguinte, ele faz recomendações de política econômica ao próprio Fed.

Até hoje, o banco central americano manteve um curso constante e inatacável. Mas, desde que a Casa Branca vem fazendo recomendações e exigências abertamente, por exemplo sobre as taxas de juros do país, não está claro se a confiança na neutralidade política do Fed poderá ser mantida.

Tampouco alguém quer apostar no curso de política econômica de Trump. Suas ações se contradizem com demasiada frequência: ele fala de amplos acordos comerciais, mas até agora só houve rejeições e nenhum dos acordos prometidos foi concretizado. Uma guerra comercial com a China, a incerteza sobre a relação com a Rússia e, mais recentemente, a briga com a Turquia que levou à desvalorização vertiginosa da lira do país… na atual situação de conflito, o dólar não é lá muito seguro como investimento.

Fica a pergunta: que moeda dará o tom no futuro? Rússia e Turquia anunciaram que querem voltar a realizar as negociações internacionais em moeda nacional, poupando-se do desvio pelo caminho do dólar.

Possivelmente, outros países poderão imitá-los, e o dólar será menos dominante no comércio global. Porém, ele continuará sendo a moeda única mais forte enquanto continuarem depositando mais confiança nos EUA, mesmo nas situações mais caóticas, do que nos países com outras moedas.

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