Luiz Alberto Machado[1]
62 anos acompanhando a economia e o varejo brasileiros é o subtítulo do livro O legado silencioso de Marcel Solimeo, lançado no dia 11 de setembro na Associação Comercial de São Paulo. Esse subtítulo reflete extraordinariamente bem a trajetória profissional de alguém que acompanhou, entre outras coisas relevantes, três constituições, oito planos econômicos, oito moedas, milagre econômico, hiperinflação, confisco da poupança, moratória da dívida externa, pandemia e impeachment de dois presidentes. Se não bastasse, conviveu com todos os presidentes da República desde 1964, mais de 20 ministros da Fazenda, dezenas de presidentes do Banco Central, além de governadores, prefeitos e autoridades de diversos órgãos e setores não só do Brasil, mas também do exterior.
Escrito pelo empresário James Mohr-Bell, que integra o Comitê de Análise da Conjuntura da Associação Comercial, criado há décadas por Edy Luiz Kogut e Jorge Wilson Simeira Jacob, o livro oferece uma excelente oportunidade de conhecer aspectos da vida pessoal de Marcel Solimeo e de fazer uma gostosa viagem pela história econômica do Brasil nas últimas seis décadas.
Solimeo destaca o Plano Real em sua concepção total, incluindo as privatizações e a parte fiscal, que infelizmente não se completou, como o principal fato político ou da economia deste período e afirma, com absoluta convicção, que sua longa permanência na entidade deveu-se ao total alinhamento dos valores defendidos por ela com os seus próprios valores que incluem integridade, legalidade, defesa do empreendedor e da iniciativa privada e respeito pela hierarquia.
Ao longo desse tempo, Solimeo foi de importância fundamental para diversos presidentes da Associação Comercial, alguns dos quais tiveram participação destacada na vida política nacional e na formação e fortalecimento do PSD e da Fundação Espaço Democrático, como Guilherme Afif Domingos, Alfredo Cotait e, mais recentemente, Roberto Ordine.
Apesar de identificar um saldo positivo no balanço da história do Brasil nesses mais de 60 anos, Solimeo expressa preocupação quando se refere ao atual momento, como fica claro no trecho que se segue com o qual encerro meu artigo: “Sob minha ótica, em uma visão panorâmica, considero que atravessamos um período extremamente grave do ponto de vista das instituições, a começar pela Constituição, que não tem servido para tranquilizar os cidadãos, pois tem sido sistematicamente ignorada pelos que deveriam resguardá-la. O Executivo não aceita restrições a seu poder de gastar livremente, nomear sem observar as regras, aumentar a participação do Estado na economia, reviver medidas que não deram certo e buscar acerto de contas com o passado. O Judiciário se tornou ativista, com uma visibilidade inconveniente na mídia, sendo mais fonte de instabilidade do que garantidor dos direitos individuais. O Congresso, ao invés de defender suas prerrogativas, e a dos cidadãos que elegem seus componentes, procura ampliar seus privilégios, abrindo mão de competências e de seus deveres constitucionais. A sociedade está dividida verticalmente entre omissos e fanáticos, e horizontalmente entre conservadores e progressistas, entre os quais se destacam os identitários, muito ativos nas questões dos costumes”.
[1] Economista, graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Mackenzie, mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal), é sócio-diretor da empresa SAM – Souza Aranha Machado Consultoria e Produções Artísticas e consultor da Fundação Espaço Democrático. Foi presidente do Corecon-SP e do Cofecon.