BC Blog Alíquotas Efetivas de Impostos no Brasil (2000-2023)

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Neste texto apresentamos uma estimativa trimestral das alíquotas efetivas dos impostos sobre consumo, renda do trabalho e capital no Brasil de 2000 a 2023, construída com base na metodologia de Azevedo e Fasolo (2015). Destacamos a diminuição das alíquotas efetivas do consumo e do capital, e o aumento da alíquota da renda do trabalho. Apontamos alguns fatores que influenciaram esses movimentos, como mudanças na composição dos impostos, retração das receitas e o impacto da pandemia em 2020.

Angelo Marsiglia Fasolo , Carla Tito Fernandes , Nelson da Silva .

Publicado 06/12/2024 às 12:48
Atualizado 06/12 às 12:48


​​​​1. Introdução

O uso das chamadas alíquotas efetivas de impostos possui papel importante na modelagem macroeconômica e na formulação de políticas econômicas. Conforme apontado por Mendoza, Razin e Tesar (1994) e Azevedo e Fasolo (2015), essas estimativas servem como ponte entre a teoria econômica e a prática, fornecendo dados concretos para a avaliação quantitativa dos impactos da política fiscal. Entre outros exemplos, elas permitem a simulação de diferentes cenários e a avaliação das consequências de medidas fiscais sobre a economia.

Neste texto revisitamos o trabalho e a metodologia de Azevedo e Fasolo (2015), atualizando as alíquotas efetivas trimestrais dos impostos sobre consumo, renda do trabalho e capital entre 2000 e 2023. Uma vez obtidas as novas séries, busca-se identificar alguns dos fatores capazes de influenciar as alíquotas efetivas, levando em conta a dinâmica desagregada dos componentes de cada alíquota e suas correlações com os principais componentes do PIB e da renda das famílias.

2. Componentes e Cálculo das Alíquotas efetivas

Nas Tabelas 1 e 2, apresentamos a classificação dos impostos nas categorias de consumo e renda, bem como os componentes da receita e da base tributária, juntamente com as fórmulas de cálculo das alíquotas efetivas proposta na metodologia de Azevedo e Fasolo (2015).i

Tabela 1: Alíquota Efetiva por Categoria e Componentes

Tabela 2: Tributos por Tipo de Receita no Cálculo da Alíquota Efetiva

Tributo Descrição Categoria Tributária
ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços Consumo (Tc)
II Imposto de Importação
IPI Imposto sobre Produtos Industrializados
Cide Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico
Cofins Contribuição para Financiamento da Seguridade Social
IOF Imposto sobre Operações Financeiras
ISS Imposto sobre Serviços
IRRF – trabalho Imposto sobre a renda (IR) – retido na fonte – Renda do trabalho (Tl)
PIS-PASEP Programa de Integração Social e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
RGPS Contribuições previdenciárias (Regime Geral de Previdência Social)
CPSS Contribuição do Plano de Seguridade do Servidor federal, estadual e municipal
SE + S Salário Educação + Sistema S
IRPJ Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica Renda do capital (Tk)
IRRF-Capital Imposto sobre a renda – retido na fonte – rendimento do capital
ITCMD Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação
CPMF Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira
CSLL Contribuição Social sobre o Lucro Líquido
IPVA Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores
ITR Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural
IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano
ITBI Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis

3. Dados

Receita

A receita tributária provém das mesmas fontes de dados utilizadas por Azevedo e Fasolo (2015), complementadas pelas informações disponibilizadas pelo Tesouro Nacional no Boletim Trimestral de Estatísticas Fiscais do Governo Geral. Detalhes sobre essas fontes estão na Tabela 3. Os impostos sobre o consumo representam 42,9% da arrecadação total. O ICMS é a principal fonte de receita, 22,4%, enquanto IPI, imposto de importação, CIDE, Cofins e IOF compõem 17,6% e ISS 3,0%. Impostos sobre renda do trabalho somam 35,8%, incluindo FGTS (5,5%), IRRF/Rendimentos do Trabalho e PIS/PASEP (7,5%), RGPS e RPPS/Federal, Estados e Municípios (21,1%). Impostos sobre o capital contribuem com 17,7%, liderados por IRPJ e CSLL (10,9%).ii

Tabela 3: Dados sobre Receitas Fiscais com Frequência Trimestral

Tributo Classificação Jurisdição Fonte* % Receita Total**
IPI, Importação, CIDE, Cofins e IOF Consumo Federal STN 17,55
ICMS Consumo Estadual Ipeadata/STN 22,41
ISS Consumo Municipal Siconfi/STN 2,96
IRPF, IRRF/Remessas ao Exterior e IRRF/Outros Renda Federal STN 3,54
FGTS Trabalho Federal CEF 5,50
IRRF/Rendimentos do Trabalho e PIS/PASEP Trabalho Federal STN 7,48
Salário educação e Sistema S Trabalho Federal RFB 1,78
RGPS e RPPS/Federal Trabalho Federal STN 19,38
RPPS/Estados Trabalho Estadual Siconfi/STN 1,16
RPPS/Municípios Trabalho Municipal Siconfi/STN 0,52
IRPJ, CSLL Capital Federal STN 10,94
ITR e IRRF/Capital Capital Federal Ipeadata 2,82
CPMF Capital Federal STN 0,58
IPVA e ITCD Capital Estadual Ipeadata 2,26
IPTU e ITBI Capital Municipal Siconfi/STN 1,12

Base Tributária

Como mencionado na Tabela 1, a base tributária do consumo é a soma do consumo das famílias e do governo, disponíveis nas Contas Nacionais Trimestrais. Para calcular a renda do trabalho, utilizamos a mesma metodologia empregada na estimativa mensal da Renda Nacional Disponível Bruta das Famílias (RNDBF), calculada por BANCO CENTRAL DO BRASIL (2021).iii, iv A remuneração do trabalho na RNDBF entre 2000T1 e 2002T4 foi retropolada com base na metodologia proposta por Alves e Fasolo (2015). A renda do capital, por sua vez, foi obtida pela diferença entre o valor adicionado medido nas Contas Nacionais Trimestrais e a série trimestral de remuneração do trabalho, cujo cálculo foi descrito acima.

4. Evolução das Receitas

A Figura 1 resume a evolução de 2000 a 2023 da carga tributária por categoria de tributo e a participação percentual de cada categoria na arrecadação total, usando a média móvel de quatro trimestres. O gráfico (1) mostra a evolução da receita tributária como proporção do PIB para as categorias de tributos: consumo, trabalho e capital. A receita tributária de consumo se destaca como a principal fonte, enquanto a receita tributária do trabalho cresce gradualmente até 2020 e a do capital apresenta maior volatilidade.

Figura 1: Receita tributária como proporção do PIB e participação na arrecadação total das diferentes classes de tributos (consumo, trabalho e capital) – média móvel de quatro trimestres

O gráfico (2) mostra a participação das diferentes categorias de impostos na arrecadação. Observa-se que os impostos sobre o consumo diminuíram de 47% no início do período para 40% no final de 2023. Em contrapartida, os impostos sobre a renda do trabalho aumentaram até 2018, enquanto os impostos sobre a renda do capital caíram. Desde então, a participação dos impostos sobre a renda do capital tem se recuperado gradualmente, chegando a 20% no final de 2023.

5. Estimativa das Alíquotas Efetivas

A Figura 2 mostra a estimativa das alíquotas efetivas de impostos sobre o consumo, trabalho e capital, com ajuste sazonal, no período de 2000T1 a 2023T4, junto com a tendência extraída pelo filtro HP para cada uma das séries.v Ver planilha com estimativas das alíquotas efetivas aqui.

Figura 2: Alíquotas efetivas com ajuste sazonal (2000T1 – 2023T4)

Consumo

Até o início de 2008, a alíquota apresentou tendência de crescimento. Após a crise financeira internacional, a alíquota decaiu gradualmente até 2016. A pandemia provocou um declínio abrupto na alíquota no primeiro semestre de 2020, seguido por uma recuperação gradual e um retorno ao nível pré-pandemia em 2023. Como resultado, o período pós-pandemia exibiu certa volatilidade na tendência capturada pelo filtro HP.

A tendência de queda na alíquota observada na segunda metade do período pode estar associada a dois fatores: (1) mudança na composição dos impostos sobre o consumo em relação ao total arrecadado ou (2) deslocamento do consumo para produtos de menor incidência tributária, como, por exemplo, alimentos da cesta básica. O primeiro fator está relacionado à redução, observada na segunda metade do período, nas participações da Cofins e do IPI na arrecadação, impulsionada pelas desonerações trazidas pela Lei nº 12.839, de 09 de julho de 2013. Essa lei reduziu a zero as alíquotas da Cofins e de outros tributos incidentes sobre produtos da cesta básica.vi O segundo fator está associado tanto com o aumento no número de famílias com rendimento entre zero e dois salários mínimos,vii quanto com o elevado comprometimento da renda dessas famílias com itens como alimentação e habitação.viii

Trabalho

Houve tendência de aumento nas alíquotas estimadas até 2008, seguido de estabilização a partir de 2010. Na pandemia, a alíquota efetiva sobre a renda do trabalho sofreu redução de 4,4 pontos percentuais na comparação entre o segundo trimestre de 2020 e o mesmo período de 2019. Essa queda se deve principalmente à retração das receitas sobre a renda do trabalho, que apresentaram um decréscimo de 28% no mesmo período.ix As contribuições previdenciárias ao RGPS, que representam a maior parcela da receita total da renda do trabalho (cerca de 49%), sofreram redução de 35%. O FGTS e o PIS/PASEP, que juntos representam em média 23% da receita total da renda do trabalho, também registraram quedas acentuadas. A base tributária, por sua vez, teve queda menor, de apenas 10.

Na comparação com Azevedo e Fasolo (2015), considerando os períodos coincidentes (2000 a 2014), a alíquota efetiva aqui calculada é cerca de 2p.p. inferior, em função do uso de fontes distintas para a apuração do rendimento do trabalho no cálculo da base tributária, conforme explicado anteriormente.

Capital

Há três períodos distintos na dinâmica da alíquota efetiva sobre o capital. Primeiro, até 2008, a alíquota média flutuava ao redor de 18%. Entre 2010 e 2021, a alíquota teve forte queda, seguida de rápida recuperação, voltando a aproximar-se do patamar de 18% em 2023. Essas mudanças se devem, principalmente, a efeitos de composição dos impostos, afetando o numerador. A redução observada entre 2010 e 2021 está associada à extinção da CPMF em 2008, enquanto a recuperação no final da amostra decorreu do crescimento da arrecadação do IRPJ e da CSLL a partir de 2021. x Esses dois tributos somados correspondem a cerca de 60% da arrecadação oriunda da renda do capital. Outro fator para a redução nas alíquotas efetivas é que a medida usada como base de arrecadação dos impostos sobre o capital (EOB agregado) cresceu mais do que a arrecadação entre 2009 e 2021.

6. Conclusão

A evolução das alíquotas efetivas de impostos no Brasil reflete mudanças tanto na economia quanto na composição da tributação. A flutuação da alíquota de consumo está ligada ao deslocamento para produtos menos tributados, enquanto a alíquota efetiva sobre a renda do trabalho foi significativamente impactada pela pandemia, resultando em quedas acentuadas nas receitas e contribuições sociais. A alíquota sobre a renda do capital apresentou uma trajetória descendente devido ao fim da CPMF, seguida por um aumento após a grande queda observada durante a pandemia.

Referências

  • ALVES, S. A. L.; FASOLO, A. M. Not Just Another Mixed Frequency Paper. Banco Central do Brasil, Departamento de Estudos e Pesquisas, set. 2015. (Working Papers Series, n. 400). Disponível em:
    https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/WorkingPaperSeries/wps400.pdf
  • AZEVEDO, C. F.; FASOLO, A. M. Effective Tax Rates on Consumption and Factor Incomes: a quarterly frequency estimation for Brazil. Banco Central do Brasil, Departamento de Estudos e Pesquisas, set. 2015. (Working Papers Series, n. 398). Disponível em:
    https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/WorkingPaperSeries/wps398.pdf
  • BANCO CENTRAL DO BRASIL. Estimativa mensal da Renda Nacional Disponível Bruta das Famílias. Banco Central do Brasil, dez. 2021. (Nota Técnica do Banco Central do Brasil, n. 55). Disponível em:
    https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/notastecnicas/NT_55_202112.pdf
  • MENDOZA, E. G.; RAZIN, A.; TESAR, L. L. Effective tax rates in macroeconomics: Cross-country estimates of tax rates on factor incomes and consumption. Journal of Monetary Economics, v. 34, n. 3, p. 297–323, 1994.
    https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/0304393294900213

As opiniões expressas nesse trabalho são exclusivamente dos autores e não refletem, necessariamente, a visão do Banco Central do Brasil.

Nelson da Silva, Angelo Marsiglia Fasolo e Carla Tito Fernandes são servidores do Banco Central do Brasil, e atuam no Departamento de Estudos e Pesquisas (Depep).

  1. Os gastos do governo nas Contas Nacionais não incluem o gasto com funcionalismo público, o que exige um ajuste em relação à metodologia de Mendoza, Razin e Tesar (1994) no tocante à τ_c da Tabela 1.
  2. A parcela federal do imposto sobre a renda, seguindo a definição de Azevedo e Fasolo (2015), é representada pelo IRPF, IRRF/Remessas ao Exterior e IRRF/Outros, totalizando 3,5%.
  3. Como mencionado na Tabela 1, a remuneração do trabalho nas contas nacionais compreende salários e o rendimento misto bruto. Esses dados são divulgados em frequência anual pelo IBGE nas Contas Nacionais Anuais. O Banco Central do Brasil, durante o cálculo da RNDBF, faz uma estimativa dessas séries em frequência mensal que é consistente com os dados oficiais anuais.
  4. RNDBF é uma medida abrangente da renda disponível das famílias, que inclui renda de trabalho, renda de propriedade e transferências governamentais. A metodologia é baseada na Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE e na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE. Detalhes da estimativa são apresentados em BANCO CENTRAL DO BRASIL (2021). Dada a indisponibilidade da RNDBF, Azevedo e Fasolo (2015) obtiveram a renda do trabalho através de pesquisas populacionais. Portanto, em termos da base tributária, a fonte de dados diverge daquela dos autores supracitados.
  5. Depois de construídas as séries das receitas tributárias e as respectivas bases de cálculo, as alíquotas efetivas foram calculadas e ajustadas sazonalmente por meio do método X-13ARIMA-SEATS.
  6. Os produtos cujas alíquotas foram reduzidas a zero por determinação da Lei 12.839/2013 incluem: carnes, café, açúcar, óleo, manteiga, margarina, sabonete, produtos de higiene bucal e papel higiênico. Segundo o Dieese, na Nota Técnica nº 120, de março de 2013, as alíquotas desses produtos variavam de 9,25% a 12, 50% antes das desonerações.
  7. O número de famílias por classe de rendimento está disponível nas Tabelas 6971 e 1595 da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) de 2018 e 2008, respectivamente.
  8. Despesas com alimentação e habitação por classe de rendimento estão disponíveis na Tabela – 6715 (POF, 2018).
  9. As medidas tributárias adotadas no combate à pandemia, que incluíram o diferimento de impostos trabalhistas durante esse período, podem explicar a queda acentuada nas receitas seguida de um aumento significativo quando as cobranças foram retomadas.
  10. Cabe destacar a importância da majoração do CSLL para as instituições financeiras em 2021, com impacto na arrecadação a partir de outubro daquele ano.



Temas: Alíquotas efetivas, Composição dos impostos, Tributação e política fiscal.

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